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Rua da Vergonha

Ao contrário de quase todos os últimos filmes de Mizoguchi — quase todos baseados em temas históricos, todos os “filmes de época” ou jidai-geki como no Japão os chamam — AKASEN CHITAI é um gendai-geki, ou seja, uma obra de tema contemporâneo. A acção situa-se nos inícios dos anos 50 e é mesmo precisada pela referência à discussão parlamentar da lei da prostituição. Mas não é essa a básica novidade do filme. Mizoguchi fez muitos outros gendai-geki centrados como AKASEN CHITAI em histórias de prostitutas. [] Mas esse mundo, que tanto o atraiu, jamais terá sido tão condensado e tão rarefeito como no filme que vamos ver. []

Neste filme em que não há uma cena de amor físico (apenas aquele reflexo de corpo nu naquele assombroso décor da casa de banho) tudo é erótico, porque é mortal. Ficam-nos dele os corpos verticais das mulheres mais profundamente amadas — nunca houve “cineasta de mulheres” como Mizoguchi — e a posição rasteira ou titubeante dos homens mais mal tratados da história do cinema. Cinco meses depois da estreia de AKASEN CHITAI, quando preparava HISTÓRIA DE OSAKA, nova adaptação de Saikaku, Mizoguchi morreu de leucemia a 24 de Agosto de 1956, ano 31 da era Showa. Tinha 58 anos. Sobre o seu túmulo, Mizoguchi Masoichi Nagata mandou gravar como epitáfio: “Aqui jaz o maior cineasta do mundo”. Quem não conhecer os filmes analisados neste volume — e que são pouco mais do que um terço de tudo quanto fez — achará que exagerou.

John Ford, Fritz Lang, Carl Th. Dreyer, Jean Renoir, entre os cineastas que, como Mizoguchi, começaram no cinema mudo e continuaram, sem solução de continuidade no sonoro, são os únicos que vejo de quem se pode dizer que foram tão grandes como. De maiores, não sei de nenhum. — João Bénard da Costa, Kenji Mizoguchi – As Folhas da Cinemateca, Cinemateca Portuguesa, Museu do Cinema (excerto)